sexta-feira, 14 de novembro de 2008

MARIA E OS PADRES DE IGREJA

NOSSA SENHORANOS ESCRITOS DE ALGUNS SANTOS PADRES

Os monumentos das Catacumbas não são os únicos que proclamam o culto dos primeiros cristãos a Maria.
A invocação a Nossa Senhora se conclui dos escritos dos Santos Padres, desde os primeiros, preocupados em demonstrar e defender as prerrogativas da Santíssima Virgem.
Em muitas passagens dos Actos dos Apóstolos lemos que os cristãos primitivos pediam aos seus irmãos que intercedessem por eles, porque estes irmãos eram discípulos e amigos de Cristo.
Seria inacreditável que não recorressem à intercessão de Maria, a Mãe de Jesus, para alcançarem as suas graças.
Se muitos testemunhos vamos encontrar da crença e afirmação das prerrogativas de Nossa Senhora, de sua Maternidade Divina, Virgindade, antes, durante e depois do parto, documentos que nos comprovem em escritos o culto de invocação a Maria, confessamos nos ser difícil encontrá-los.
Isto porque nos ficaram pouquíssimas obras anteriores à paz da Igreja, nos princípios do século IV, e em sua maior parte livros de apologética e de controvérsias, nos quais dificilmente encontraríamos de modo explícito o culto a Maria.
A princípio Maria ocupa lugar modesto e pouco se fala dela. Não obstante, as afirmações dogmáticas da Santíssima Virgem se encontram desde os primeiros tempos e na falta de documentos escritos da invocação a Maria, delas deduzimos o grande apreço que os fiéis primitivos tinham para com a Mãe de Deus.
A primeva onda mariológica começa na idade apostólica e chega ao seu auge com a definição da Maternidade Divina no Concílio de Éfeso, no ano 431.
Três são as principais ideias mariológicas na época que precede o citado concílio: A Mãe de Deus, a Virgem intacta, a Nova Eva.
No Oriente, os Santos Padres colocam em relevo a maternidade divina. Para Santo Inácio, bispo de Antioquia, Jesus, o Filho de Deus, foi verdadeiramente gerado, segundo a natureza humana, por Maria (Aos Efésios 7,2).
São Justino Mártir escreve que Jesus, que é Deus, tomou de Maria a natureza humana e nasceu dela como homem.
Santo Irineu propõe a mesma doutrina e a comprova com argumentos da Sagrada Escritura e da Tradição Católica.
A Virgindade de Maria foi também defendida pelos Padres da Igreja. Na carta aos Efésios, Santo Inácio afirma a virgindade antes do parto e faz uma alusão à virgindade no parto. São Justino nos deixou documentos com a mesma afirmação. Santo Irineu já afirma explicitamente a Virgindade antes e no parto, e implicitamente depois do parto.
A virgindade perpétua, antes, durante e depois do parto, será afirmada mais tarde por Orígenes. São Pedro de Alexandria será o primeiro a designar Maria com o nome de “Virgem”. Exaltam a perpétua virgindade Santo Efrém, Santo Epifânio, São João Crisóstomo, São Gregório Taumaturgo e outros.
A ideia de Maria, a Nova Eva, encontra-se já no século II em São Justino: "Cristo fez-se homem por meio da Virgem, afim de que a desobediência provocada pela serpente tivesse fim pela mesma via por onde havia começado".
Santo Irineu desenvolve esta ideia e chama a Maria, a Advogada de Eva".
Também alusões à santidade e realeza de Maria encontramos nos Santos Padres. De modo explícito Santo Efrém fala que Maria é imune de toda mancha de culpa.
São Gregório invoca a Maria e afirma que por sua intercessão recebera a verdadeira doutrina da fé sobre a Santíssima Trindade. Este facto pareceu tão natural que ninguém se admirou, o que prova que o culto deprecatório à Mãe de Deus não era uma novidade na Igreja.
No Ocidente, a Mariologia foi descrita pelos Santos Padres realçando as prerrogativas de Nossa Senhora.
Tertuliano faz da maternidade divina o centro de sua Mariologia. Santo Hipólito Romano é o primeiro a usar o termo "Theotocos", isto é, Mãe de Deus. E a maternidade divina é exaltada por Santo Ambrósio, Santo Agostinho, São Zenon e outros. Em relação à virgindade perpétua, para Santo Hipólito Maria Santíssima é a Virgem por antonomásia.
Santo Ambrósio faz da Virgindade perpétua de Maria o ponto central de sua Mariologia. O mesmo ensinam outros Santos Padres, como Santo Agostinho, e São Jerónimo, que foi o primeiro e o mais forte apologista da virgindade perpétua de Maria.
Entre os ocidentais foi Tertuliano o primeiro a pôr em relevo a ideia de Maria, a Nova Eva. Santo Ambrósio, no notável paralelismo Eva-Maria, afirma que a Virgem concebeu a salvação de todos. Fala depois sobre a maternidade espiritual e universal de Maria, fundamentando-a na doutrina paulina do Corpo Místico de Cristo, que por Maria tornou-se cabeça universal da humanidade. A ideia de Maria, a Nova Eva, encontra-se também em São Zenon, São Jerónimo e Santo Agostinho. Como Santo Ambrósio, fala-nos Santo Agostinho da maternidade espiritual de Maria, a “Mãe dos membros de Cristo, que somos nós”.
A santidade e realeza de Maria são exaltadas especialmente por Santo Ambrósio, Santo Agostinho e São Jerónimo.
Apresentam-na como o modelo das Virgens, imune de qualquer mancha de culpa e sempre "'na luz e nunca nas trevas".
Houve motivos que impedissem um mais notável desenvolvimento da Mariologia em sua primeira fase, isto é, dos tempos apostólicos até o Concílio de Éfeso. Primeiro, as contínuas perseguições no Oriente e no Ocidente; depois, a atenção dos Padres voltada quase exclusivamente para a figura de Cristo, centro da doutrina cristã; em terceiro lugar, os erros cristológicos daqueles tempos. Estes erros destruindo o verdadeiro homem, o verdadeiro Redentor, comprometiam também indirectamente em Maria a qualidade de Mãe, de Virgem e de Nova Eva.
Contra os docetas que negavam a verdadeira humanidade de Cristo, os Padres opuseram a real maternidade de Marfa. Contra os arianos que negavam a divindade de Jesus, opuseram o seu nascimento virginal, prodigioso. Contra o falso conceito de mediador e a multiplicidade de mediadores, opuseram o plano divino no qual o novo Adão, Único Mediador perfeito para reconciliar a Deus com os homens, está associada a nova Eva, em oposição ao primeiro Adão e à primeira Eva que com o pecado afastaram a Deus dos homens.
Embora sem carácter de novidade, o que prova a existência anterior do culto a Maria, sua devoção espalhou-se extraordinariamente, quando o III Concílio Ecuménico, celebrado em Éfeso, em 431, profligando as heresias de Nestório e seus sequazes, definiu a Maternidade Divina de Maria.
No ano seguinte o Papa Sixto III consagrava em Roma a patriarcal basílica de Santa Maria Maior. Igrejas e Santuários se levantaram por todo o mundo em honra da Santíssima Virgem, Mãe de Deus. Na liturgia da Igreja se introduziram as grandiosas festas de Nossa Senhora, Rainha e Senhora do Universo.
Assim se explica a devoção a Marfa Santíssima, cujas raízes se lançaram no início do cristianismo. O que cremos de Maria, o que honramos em Maria, é aquilo mesmo, nem mais nem menos, que nossos antepassados na fé creram e veneraram desde a origem da Igreja: a Maternidade Divina e a Maternidade de graça da Maria, a Mãe de Cristo Jesus e a Medianeira da salvação.


Cónego Paulo Dilascio
“As mais belas Histórias do Cristianismo”

terça-feira, 28 de outubro de 2008

MARIA ENGRANDECE O SENHOR

Maria engrandece o Senhor
pela singularidade de seu amor

A alma de Maria engrandece o Senhor porque ela foi por ele primeiro engrandecida. Se não tivesse sido antes engrandecida pelo Senhor, a alma de Maria não teria podido engrandecê-lo. Engrandece, portanto, aquele por quem foi engrandecida, não somente pelo louvor de sua boca e pela integridade de seu corpo, mas pela singularidade de seu amor.
Muitos engrandecem pela língua, mas blasfemam por seu comportamento, procedendo com soberba de coração. A seu respeito é que foi escrito: Afirmam que conhecem a Deus, mas o negam com seus actos (Tt 1, 16). Esses não engrandecem, antes diminuem o quanto podem o nome do Senhor. É a eles que se dirige o Apóstolo: O nome de Deus é blasfemado entre as nações por causa de vós! (Rm 2, 24).
Em Maria, pelo contrário, a língua, a vida, a alma engrandecem o Senhor. A língua, narrando a santa magnificência da glória divina; a vida, tornando-se digna da mesma glória por suas obras; a alma, amando-o de maneira singular, atingindo-o pelas asas da contemplação, e contendo em seu espírito e em seu seio a incompreensível magnificência. Por isso, proclama: Minha alma engrandece o Senhor (Lc 1, 46).
Como é que o engrandeces? Porventura, tornarias maior aquele cuja grandeza é infinita? Grande é o Senhor e muito digno de louvores (Sl 144 [145], 3), exclama o salmista. Tão grande, tão grande, que sua grandeza não tem comparação nem medida. Como então o engrandeces, se de pequeno não o fazes grande, nem de grande maior ainda? Tu o engrandeces porque o louvas, porque, mais luminosa que o sol, mais bela que a lua, mais perfumada que a rosa, mais branca que a neve, fazes crescer o esplendor do conhecimento de Deus em meio às trevas deste mundo. Tu o engrandeces, portanto, não aumentando a sua grandeza sem limites, mas trazendo para as trevas deste mundo, que a desconhece, a luz da verdadeira Divindade. Pois o Senhor que engrandeces, assim como ignora o tempo por ser eterno, também não admite progresso, por ser perfeito.
Ele é eterno porque não tem começo nem fim. É perfeito porque nada falta a sua plenitude. E, contudo, tu o engrandeces quando, por teus méritos eminentes, és exaltada a ponto de receberes a plenitude da graça, de seres digna da visita do Espírito Santo, de dares à luz o Salvador do mundo que perecia, permanecendo virgem, e se tornando a Mãe do Filho de Deus.

Adão de Persénia, abade: Carta 2, 13-15(Sources Chrétiennes 66, 62-64)

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

VATICANO II E MARIA - XI

Espírito da pregação e do culto

O Sagrado Concílio ensina deliberadamente esta doutrina católica e exorta ao mesmo tempo todos os filhos da Igreja a que promovam dignamente o culto da Virgem Santíssima, de modo especial o culto litúrgico; a que tenham em grande estima as práticas e os exercícios de piedade que em sua honra o magistério da Igreja recomendou no decorrer dos séculos; e a que observem religiosamente quanto foi estabelecido no passado acerca do culto das imagens de Cristo, da Santíssima Virgem e dos santos. Além disso, exorta com todo o empenho os teólogos e os pregadores da palavra divina a que, ao considerarem a singular dignidade da Mãe de Deus, se abstenham com cuidado, tanto de qualquer falso exagero, como também duma demasiada pequenez de espírito. Com o estudo da Sagrada Escritura, dos santos padres, dos doutores, e das liturgias da Igreja, esclareçam com precisão, sob a orientação do magistério. as funções e os privilégios da Santíssima Virgem, que sempre se referem a Cristo, origem de toda a verdadeira santidade e devoção. Evitem diligentemente tudo o que, por palavras ou por obras possa induzir em erro os irmãos separados ou quaisquer outras pessoas, quanto à verdadeira doutrina da Igreja. Por sua vez, recordem-se os fiéis de que a devoção autêntica não consiste em sentimentalismo estéril e passageiro, ou em vã credulidade, mas procede da fé verdadeira que nos leva a reconhecer a excelência da Mãe de Deus e nos incita a um amor filial para com a nossa Mãe, e à imitação das suas virtudes.

VATICANO II; Lumen gentium, 67.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

VATICANO II E MARIA - X


O culto da Santíssima Virgem na Igreja:
Natureza e fundamento deste culto

Maria foi exaltada pela graça de Deus acima de todos os anjos e de todos os homens, logo abaixo de seu Filho, por ser a Mãe Santíssima de Deus e, como tal, haver interferido nos mistérios de Cristo: por isso, a Igreja a honra com culto especial. Na verdade, já desde os mais antigos tempos, a Santíssima Virgem é venerada com o título de "Mãe de Deus", recorrendo os fiéis com súplicas à sua protecção em todos os perigos e necessidades. Sobretudo a partir do Concilio de Éfeso, o culto prestado a Maria pelo povo de Deus cresceu admiravelmente, manifestando-se em veneração, amor, invocação e imitação, cumprindo-se as palavras proféticas da própria Virgem: "Todas as gerações me chamarão bem-aventurada, porque fez em mim grandes coisas aquele que é poderoso" (cf. Lc 1,48). Este culto, tal como existiu sempre na Igreja, é de todo singular, mas difere essencialmente do culto de adoração que é prestado ao Verbo encarnado e do mesmo modo ao Pai e ao Espírito Santo, e muito contribui para ele. Pois que as várias formas de devoção para com a Mãe de Deus, que a Igreja aprovou ― dentro dos limites da doutrina sã e ortodoxa, segundo as circunstâncias de tempos e lugares, e atendendo à índole e ao modo de ser dos fiéis ― fazem que, ao honrarmos a Mãe, seja bem conhecido, amado e glorificado o Filho, e bem observados os mandamentos daquele "pelo qual existem todas as coisas" (cf. Cl 1,15-16) e no qual "aprouve ao eterno Pai que habitasse toda a plenitude" (cf. Cl 1,19).

VATICANO II; Lumen gentium, 66.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

VATICANO II E MARIA - IX

Virtudes de Maria que a Igreja deve imitar

Na Santíssima Virgem, a Igreja alcançou já essa perfeição que faz que ela se apresente sem mancha nem ruga (cf. Ef 5,27). Os fiéis, porém, continuam ainda a esforçar-se por crescer na santidade, vencendo o pecado; por isso levantam os olhos para Maria que refulge a toda a comunidade dos eleitos como modelo de virtudes. A Igreja, reflectindo piedosamente sobre Maria e contemplando-a à luz do Verbo feito homem, penetra cheia de respeito, mais e mais no íntimo do altíssimo mistério da encarnação, e vai tomando cada vez mais a semelhança do seu Esposo. Com efeito, quando é exaltada e honrada Maria - que, pela sua cooperação íntima na história da salvação, de certo modo reúne e reflecte as maiores exigências da fé - ela atrai os crentes para seu Filho, para o sacrifício dele e para o amor do Pai. E a Igreja, por sua vez, empenhada como está na glória de Cristo, torna-se mais semelhante à excelsa figura que a representa, progredindo continuamente na fé, na esperança e na caridade, buscando e cumprindo em tudo a vontade de Deus. Com razão, a Igreja, também na sua actividade apostólica, olha para aquela que gerou a Cristo, concebido do Espírito Santo o nascido da Virgem precisamente para que nasça e cresça também no coração dos fiéis, por meio da Igreja. A Virgem, durante a vida, foi modelo daquele amor materno de que devem estar animados todos aqueles que colaboram na missão apostólica da Igreja para a redenção dos homens.

VATICANO II; Lumen gentium, 65.

domingo, 12 de outubro de 2008

VATICANO II E MARIA - VIII

Maria, como Virgem e Mãe, figura da Igreja

A Santíssima Virgem encontra-se intimamente unida à Igreja, pelo dom e cargo da maternidade divina, que a une com seu Filho redentor, e ainda pelas suas graças e prerrogativas singulares: a Mãe de Deus é a figura da Igreja, como já ensinava santo Ambrósio, quer dizer, na ordem da fé, da caridade e da perfeita união com Cristo. De fato, no mistério da Igreja, a qual também se chama com razão virgem e mãe, à Santíssima Virgem Maria pertence o primeiro lugar, por ser, de modo eminente e singular, exemplo de virgem e de mãe. Pois, pela sua fé e obediência, gerou na terra o próprio Filho de Deus-Pai: sem conhecer varão, mas pelo poder do Espírito Santo, acreditando sem hesitar, qual nova Eva, não na antiga serpente mas no mensageiro divino. Deu à luz o Filho, a quem Deus constituiu primog2nito entre muitos irmãos (cf. Rm 8,29), isto é, entre os fiéis em cuja geração e formação ela coopera com amor de mãe.

Fecundidade da Virgem e da Igreja

A Igreja, contemplando a santidade misteriosa de Maria, imitando a sua caridade, e cumprindo fielmente a vontade do Pai, pela palavra de Deus fielmente recebida torna-se também ela mãe: pela pregação e pelo batismo gera, para uma vida nova e imortal, os filhos concebidos do Espírito Santo e nascidos de Deus. E é também virgem, que guarda a fé jurada ao Esposo, íntegra e pura; e, à imitação da Mãe do seu Senhor, conserva, pela graça do Espírito Santo, virginalmente íntegra a fé, sólida a esperança, sincera a caridade.

VATICANO II; Lumen gentium, 63-64.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

VATICANO II E MARIA - VII

Maternidade espiritual

A Santíssima Virgem, predestinada ― desde toda a eternidade, no desígnio da encarnação do Verbo divino ― para Mãe de Deus, foi na terra, por disposição da divina Providência, a Mãe do Redentor divino, mais que ninguém sua companheira generosa, e a humilde escrava do Senhor. Concebendo a Cristo, gerando-o, alimentando-o, apresentando-o no templo ao Pai, sofrendo com seu Filho que morria na cruz, ela cooperou de modo absolutamente singular - pela obediência, pela fé, pela esperança e a caridade ardente - na obra do Salvador para restaurar a vida sobrenatural das almas. Por tudo isto, ela é nossa mãe na ordem da graça.

Medianeira

A maternidade de Maria, na economia da graça, perdura sem cessar, desde o consentimento que ela prestou fielmente na anunciação e manteve sem vacilar ao pé da cruz, até a consumação final de todos os eleitos. De fato, depois de elevada ao céu, não abandonou esta missão salutar, mas, pela sua múltipla intercessão, continua a obter-nos os dons da salvação eterna. Com seu amor de Mãe, cuida dos irmãos de seu Filho, que ainda peregrinam e se debatem entre perigos e angústias, até que sejam conduzidos à Pátria feliz. Por isso, a Santíssima Virgem é invocada, na Igreja, com os títulos de Advogada, Auxiliadora, Amparo e Medianeira. Mas isto deve entender-se de modo que nada tire nem acrescente à dignidade e à eficácia de Cristo, Mediador único.
Nenhuma criatura pode colocar-se no mesmo plano que o Verbo encarnado e redentor; mas, assim como o sacerdócio de Cristo é participado de modo diverso pelos ministros sagrados e pelo povo fiel, e assim como a bondade de Deus, única, se difunde realmente em medida diversa pelas suas criaturas, assim também a única mediação do Redentor não exclui, antes suscita nas criaturas uma cooperação múltipla, embora a participar da fonte única.
A Igreja não hesita em atribuir a Maria uma função assim subordinada; sente-a até continuamente e recomenda-a ao amor dos fiéis, para que, apoiados nesta protecção maternal, eles se unam mais intimamente ao Mediador e Salvador.

VATICANO II; Lumen gentium, 61-62.

sábado, 4 de outubro de 2008

MARIA TEMPLO DE DEUS

Maria é o Templo de Deus, é a porta do céu.

Antes de Maria e José passarem a conviver, ela encontrou-se grávida pela acção do Espírito Santo (Mt 1, 18). José se espanta, e a desconfiança em relação à esposa o aflige. Que fazer? Teme entregá-la com medo que a matem. Pensa em repudiá-la, o que seria mais fácil, e não a exporia aos mesmos perigos. Bastaria dar-lhe, conforme a Lei, uma carta de repúdio.
Mas depois que lhe veio esse pensamento, apareceu-lhe em sonho um anjo do Senhor, que lhe disse: “José, Filho de Davi, não tenhas receio de receber Maria, tua esposa” (Mt 1, 20). Depois que lhe veio esse pensamento, nos é dito. Como estivesse angustiado e não soubesse ainda o que fazer, eis que lhe aparece em sonho o Anjo do Senhor, o mensageiro do céu. Em sonho: não se poderia dizer de melhor modo. Com efeito, se José não tivesse adormecido, se tivesse continuado presente a si mesmo, se houvesse mantido abertos os olhos de seu espírito e de seu coração, e se tivesse reconhecido na revelação do Espírito Santo o sol que já se levantava em Maria, então, lhe teria sido impossível agitar-se em tais pensamentos.
Mas, escutemos o que diz o anjo: José, filho de Davi, não tenhas receio de receber Maria, tua esposa. Não tenhas medo, não duvides, lança fora o ciúme, repele a suspeita. A verdade é muito diferente desses pensamentos que se agitam. Esta jovem, não a conheces ainda. Maria, tua esposa, ainda não soubeste vê-la! Esta jovem é o Templo de Deus, é a porta do céu; tu a julgas tua esposa, mas deves, no entanto, servi-la.
Acolhe-a, pois, agora para te colocares à sua disposição. Ela te foi confiada e não entregue: sê para ela, em vez de marido que ordena, o servidor que obedece. Por que isto? Porque o que nela foi gerado vem do Espírito Santo (Mt 1, 20). Basta que ouças, basta que creias.

S. Bruno de Segni, bispo
Comentário sobre o Evangelho de S. Mateus
Commentarium in Matthæum, Pars I, cap. II
(Patrologia Latina 165, 74 ss).

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

VATICANO II E MARIA - VI

A Virgem Maria depois da ascensão

Foi vontade de Deus manifestar solenemente o sacramento da salvação humana, só depois de ter enviado o Espírito prometido por Cristo. Por isso, vemos os apóstolos, antes do dia do Pentecostes, assíduos e unânimes na oração, com algumas mulheres e com Maria mãe de Jesus e os irmãos deste" (At 1,14), e vemos também Maria implorando com suas preces o dom do Espírito, que na anunciação, já a tinha coberto com sua sombra. Finalmente, a Virgem Imaculada, que fora preservada de toda mancha da culpa original, terminando o curso de sua vida terrena, foi levada a glória celeste em corpo e alma, e exaltada pelo Senhor como Rainha do universo, para que se parecesse mais com o seu Filho, Senhor dos senhores (cf. Ap 19,16) e vencedor do pecado e da morte.

Maria, escrava do Senhor,
na obra da redenção

É um só o nosso Mediador, segundo as palavras do Apóstolo: “Porque há um só Deus, também há um só mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, verdadeiro homem, que se ofereceu em resgate por todos” (1Tm 2,5-6). A função maternal de Maria para com os homens, de nenhum modo obscurece ou diminui esta mediação única de Cristo, antes mostra qual é a sua eficácia. Na verdade, todo o influxo salutar da Santíssima Virgem em favor dos homens não é imposto por nenhuma necessidade intrínseca, mas sim por livre escolha de Deus, e dimana da superabundância dos méritos de Cristo, funda-se na sua mediação, dela depende absolutamente e dela tira toda a sua eficácia; e, longe de impedir, fomenta ainda mais o contacto Imediato dos fiéis com Cristo.

VATICANO II; Lumen gentium, 59-60.

sábado, 27 de setembro de 2008

VATICANO II E MARIA - V

A Virgem Maria e o Menino Jesus

Esta união da Mãe com o Filho, na obra da redenção, manifesta-se desde o momento em que Jesus Cristo é concebido virginalmente, até à sua morte. Primeiramente, quando Maria se dirigiu pressurosa a visitar Isabel, e esta a proclamou bem-aventurada por ter acreditado na salvação prometida, estremecendo o precursor de alegria no seio de sua mãe (cf. Lc 1,41-45); e depois, no nascimento, quando a Mãe de Deus, cheia de alegria, mostrou aos pastores e aos magos o seu Filho primogénito, que não diminuiu, antes consagrou a sua integridade virginal. E também quando, ao apresentá-lo no templo ao Senhor, ofereceu o resgate dos pobres e ouviu Simeão profetizar que esse Filho havia de ser sinal de contradição e que uma espada atravessaria a alma da Mãe, para que se revelassem os pensamentos de muitos corações (cf. Lc 2,34-35). O Menino Jesus perdido e com tanta dor procurado, encontraram-no Maria e José no templo, ocupado nas coisas de seu Pai; não entenderam a resposta que lhes deu; a Mãe, porém, guardava no seu coração e meditava todas estas coisas (cf. Lc 2,41-51).
A Virgem Maria no ministério público de Jesus
Na vida pública de Jesus, a sua Mãe manifesta-se claramente logo no início, quando nas bodas de Caná da Galiléia, movida de misericórdia, conseguiu com sua intercessão que Jesus, o Messias, desse início aos seus milagres (cf. Jo 2,11). Durante a pregação do seu Filho, recolheu as palavras com que ele, exaltando o reino acima das razões e vínculos da carne e do sangue, proclamou bem-aventurados os que ouvem e observam a palavra de Deus (cf. Mc 3,35 - paralelo Lc 11,27-28), como ela fazia pontualmente (cf. Lc 2,19 e 51). Assim também a Santíssima Virgem avançou no caminho da fé, e conservou fielmente a união com seu Filho até a cruz, junto da qual, por desígnio de Deus, se manteve de pé (cf. Jo 10,25); sofreu profundamente com o seu Unigénito e associou-se de coração maternal ao seu sacrifício, consentindo amorosamente na imolação da vítima que ela havia gerado; finalmente, ouviu estas palavras do próprio Jesus Cristo, ao morrer na cruz, dando-a ao discípulo por Mãe: "Mulher, eis aí o teu filho" (cf. Jo 19, 26-27).

VATICANO II; Lumen gentium, 57-58.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

IRMÃOS DE CRISTO

Somos Seus irmãos porque Sua Mãe ouviu a palavra e a pôs em prática

A Virgem Maria foi obediente quando disse: “Eis a escrava do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1, 38). Pelo contrário, Eva foi desobediente, tendo desobedecido quando era ainda virgem. E assim como Eva, desobedecendo, se tornou causa de morte para si mesma e para todo o género humano, assim também Maria, tendo por esposo aquele que lhe tinha sido antecipadamente destinado mas mantendo-se virgem, se tornou, pela sua obediência, causa de salvação para si mesma e para todo o género humano. […] Porque o que foi ligado só pode ser desligado quando se desfaz o nó, de tal maneira que um primeiro nó é desatado por um segundo, tendo o segundo a função de desatar o primeiro.
Era por isso que o Senhor dizia que os primeiros seriam os últimos, e os últimos os primeiros (Mt 19, 30). E também o profeta afirma a mesma coisa, ao dizer: “Em lugar dos teus pais, virão os teus filhos” (Sl 44, 17). Porque, ao tornar-Se “o Primogénito dos mortos”, ao receber no seu seio os pais antigos, o Senhor fê-los renascer para a vida em Deus, tornando-Se Ele mesmo “o princípio” (Col 1, 18), já que Adão fora o princípio dos mortos. É também por isso que Lucas começa a sua genealogia pelo Senhor, fazendo-a depois remontar até Adão (Lc 3, 23ss.), indicando assim que não foram os pais que deram a vida ao Senhor, mas foi Ele, pelo contrário, que os fez renascer no Evangelho da vida. Da mesma maneira, o nó da desobediência de Eva foi desatado pela obediência de Maria, porque aquilo que a virgem Eva tinha atado pela sua incredulidade foi desatado pela Virgem Maria pela sua fé.

Santo Ireneu de Lyon (c. 130-c. 208), bispo, teólogo e mártir ;
Contra as heresias, III, 22.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

ELA VIVIA DE FÉ COMO NÓS

Ver a sua vida real...


Teria, primeiro, feito entender a que ponto se conhece mal a sua vida Não precisaria de dizer coisas inacreditáveis ou que não se sabem; por exemplo, que muito pequenita, aos três anos, a Virgem Santa foi ao Templo oferecer-se a Deus com sentimentos ardentes de amor e absolutamente extraordinários; quando ela lá foi talvez simplesmente para obedecer a seus pais... Para que um sermão sobre a Virgem me agrade e me faça bem, preciso de ver a sua vida real, não a sua vida suposta; e estou certa de que a sua vida real devia ser muito simples. Mostram-na inabordável, era preciso mostrá-la imitável, fazer ressaltar as suas virtudes, dizer que ela vivia de fé, como nós; dar provas pelo Evangelho onde lemos: «eles não compreenderam o que lhes dizia» (Lc 2,50). E esta outra, não menos misteriosa: «Os seus pais ficavam admirados com o que diziam dele» (Lc 2,33). Essa admiração supõe uma certa estranheza, não acham?
Sabe-se bem que a Virgem é a rainha do Céu e da terra, mas é mais mãe que rainha, e não é preciso dizer, por causa das suas prerrogativas, que ela eclipsa a glória de todos os santos, como o sol ao nascer faz desaparecer as estrelas. Meu Deus! Eu penso exactamente o contrário, creio que ela aumentará muito o esplendor dos eleitos. Está certo falar das suas prerrogativas, mas não é preciso dizer que isso... Quem sabe se alguma alma não iria mesmo sentir um certo afastamento em relação a uma criatura tão superior e não diria para consigo: «Se assim é, mais vale brilhar tanto quanto se possa num cantinho».
O que a Virgem tinha a mais do que nós é que ela não podia pecar, que estava isenta de pecado original, mas, por outro lado, teve muito menos sorte do que nós porque não tinha Virgem Santa para amar, e é uma grande doçura a mais para nós.
Como eu gostava de ser padre para pregar acerca da Virgem Santa! Uma só vez bastava-me para dizer tudo o que penso a esse respeito.

Santa Teresa do Menino Jesus (1873-1897), carmelita, doutora da Igreja
Últimos Diálogos, 21/08/1897

VATICANO II E MARIA - IV

Maria na anunciação

Quis, porém, o Pai das misericórdias que a encarnação fosse precedida da aceitação por parte da Mãe predestinada, a fim de que, assim como uma mulher tinha contribuído para a morte, também uma mulher contribuísse para a vida. E isto aplica-se de forma eminente à Mãe de Jesus, a qual deu ao mundo aquele que é a Vida que tudo renova, e foi enriquecida por Deus com dons convenientes a tão alto múnus. Portanto, nada admira que tenha sido corrente, entre os santos padres, chamar a Mãe de Deus, toda santa e imune de qualquer mancha do pecado, como que plasmada pelo Espírito Santo e formada qual nova criatura. Adornada, desde o primeiro instante da sua conceição, com esplendores duma santidade absolutamente singular, a Virgem de Nazaré ouvindo a saudação do anjo mandado por Deus, que lhe chama "cheia de graça" (cf. Lc 1,28), responde ao mensageiro celeste: "Eis a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra" (Lc 1,38). Assim Maria, filha de Adão, consentindo na palavra divina, tornou-se Mãe de Jesus, e abraçando com generosidade e sem pecado algum a vontade salvífica de Deus, consagrou-se totalmente, como escrava do Senhor, à pessoa e obra de seu Filho, servindo ao mistério da redenção sob a sua dependência e com ele, pela graça de Deus omnipotente. Com razão afirmam os santos padres que Maria não foi instrumento meramente passivo nas mãos de Deus, mas cooperou na salvação dos homens com fé livre e com inteira obediência. Como diz santo Irineu, "pela obediência, ela tornou-se causa de salvação para si mesma e para todo o género humano". E não poucos padres antigos, na sua pregação, comprazem-se em repetir: "O laço de desobediência de Eva foi desfeito pela obediência de Maria; o que a virgem Eva atou com sua incredulidade, a Virgem Maria desatou-o pela fé". Comparando-a com Eva, chamam a Maria "Mãe dos viventes" e afirmam com frequência: "A morte veio por Eva, e a vida por Maria". (VATICANO II; Lumen gentium, 56).

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

VATICANO II E MARIA - III

A Virgem Maria e a Igreja

A Virgem Maria, que na anunciação do anjo recebeu o Verbo de Deus no seu coração e no seu corpo, e deu a Vida ao mundo, é reconhecida e honrada como verdadeira Mãe de Deus e do Redentor. Remida de modo mais sublime em atenção aos méritos de seu Filho, e unida a ele por vínculo estreito e indissolúvel, foi enriquecida com a sublime prerrogativa e dignidade de ser Mãe de Deus Filho, e, portanto, filha predilecta do Pai e sacrário do Espírito Santo; com este dom de graça sem igual, ultrapassa de longe todas as outras criaturas celestes e terrestres. Ao mesmo tempo encontra-se unida na estirpe de Adão com todos os homens que devem ser salvos; mais ainda, é “verdadeiramente mãe dos membros de Cristo... porque com o seu amor colaborou para que na Igreja nascessem os fiéis, que são os membros daquela cabeça”. Por esta razão é também saudada como membro supereminente e absolutamente singular da Igreja, e também como seu protótipo e modelo acabado da mesma, na fé e na caridade; e a Igreja Católica, guiada pelo Espírito Santo, honra-a como mãe amantíssima, dedicando-lhe afecto de piedade filial.

A Mãe do Messias no Antigo Testamento

Os livros do Antigo e do Novo Testamento, e a tradição veneranda mostram, dum modo que se vai tornando cada vez mais claro, e colocam, por assim dizer, diante dos nossos olhos a função da Mãe do Salvador na economia da salvação. Os livros do Antigo Testamento descrevem a história da salvação, que vai preparando, a passos lentos, a vinda de Cristo ao mundo. Estes primeiros documentos, tais como são lidos na Igreja e entendidos à luz da ulterior revelação completa, iluminam pouco a pouco, sempre com maior clareza, a figura de uma mulher, a da Mãe do Redentor. Ela aparece, a esta luz, profeticamente esboçada na promessa da vitória sobre a serpente, feita aos nossos primeiros pais já caídos no pecado (cf. Gn 3,15). Do mesmo modo, ela é a Virgem que há de conceber e dar à luz um Filho, cujo nome será Emanuel (cf. Is 7,14; Mq 5,2-3; Mt 1,22-23). Ela sobressai entre os humildes e os pobres do Senhor, que dele esperam confiadamente e vêm a receber a salvação. Enfim, com ela, filha excelsa de Sião, após a longa espera da promessa, atingem os tempos a sua plenitude e inaugura-se nova economia, quando o Filho de Deus assume dela a natureza humana, para, mediante os mistérios da sua carne, libertar o homem do pecado. (VATICANO II; Lumen gentium, 54-55).

terça-feira, 23 de setembro de 2008

VATICANO II E MARIA - II

Intenção do Concílio

« O sagrado Concílio, ao expor a doutrina da Igreja, na qual o divino Redentor opera a salvação, deseja esclarecer cuidadosamente quer a função da Santíssima Virgem no mistério do Verbo encarnado e do corpo místico, quer os deveres dos próprios homens remidos para com a Mãe de Deus, que é Mãe de Cristo e dos homens, em especial dos fiéis. Não é, no entanto, intenção sua propor a doutrina completa sobre Maria ou diminuir questões que a investigação dos teólogos ainda não conseguiu dilucidar plenamente. Mantém-se, portanto, no seu direito as opiniões que são livremente propostas nas escolas católicas acerca daquela que na santa Igreja ocupa o lugar mais alto depois de Cristo e o mais perto de nós. » (VATICANO II: Lumen gentium, 54.)

A Santíssima Virgem no mistério de Cristo

Querendo Deus, sumamente benigno e sábio, realizar a redenção do mundo, “quando chegou a plenitude dos tempos, mandou o seu Filho, nascido duma mulher... para que recebêssemos a adopção de filhos” (GI 4,4-5), “o qual, por amor de nós homens e para nossa salvação, desceu dos céus e encarnou pelo poder do Espírito Santo no seio da Virgem Maria”. Este mistério divino da salvação revela-se-nos e continua na Igreja, que o Senhor constituiu como seu corpo, e na qual os fiéis ― unidos a Cristo, sua cabeça, e em comunhão com todos os seus santos ― devem também, e em primeiro lugar, venerar a memória da gloriosa sempre virgem Maria, Mãe de Deus e de Nosso Senhor Jesus Cristo. (VATICANO II: Lumen gentium, 52.)

domingo, 21 de setembro de 2008

VATICANO II E MARIA - I

Introdução

O já longínquo concílio do Vaticano II consagrou, na sua Constituição dogmática “Lumen gentium”, uma parte importante à Virgem Maria, Mãe de Deus e nossa Mãe.
Esta parte da Constituição mencionada contém, sem dúvida nenhuma, algumas das mais belas páginas jamais escritas sobre Maria. Para que essas mesmas páginas não sejam esquecidas, vamos dá-las aqui, aos poucos ― como se fora um folhetim ― de maneira que cada um dos nossos leitores possa nelas se emprenhar e sentir, após essa leitura, um amor ainda mais forte, mais veemente para com a nossa bendita Mãe e Mãe imaculada de Jesus.
Durante o Concílio do Vaticano II, muitas vozes ― orquestradas certamente pelo principal inimigo de Maria ― se levantaram para dizer que era necessário destronar Maria, porque, segundo essas vozes infames, ela ocupava um lugar de relevo na devoção dos fieis, devoção esta que ― ainda segundo as mesmas vozes ― encobria a adoração devida a Deus.
Insensatos que nos fazem pensar na famosa frase de Cícero: “Oh! Quam stultorum infinitus est numerus; sollatium miserorum est socios habet”. (Ô quão grande é o número dos insensatos; o consolo dos miseráveis é de ter sócios ― ou quem os ouça e siga).
Essas vozes miseráveis nada conseguiram, antes pelo contrário: o divino Espírito Santo mostrou-lhes que nessas matérias de suma importância, Ele sabia onde “soprar”, onde “soprar” forte, de maneira que só a verdade, a única, seja levada ao conhecimento de todos os cristãos e homens de “boa vontade”. Foi isso que aconteceu e, por isso mesmo, agradeçamos ao Senhor por nos ter deixado um tal documento que enaltece Maria, a sempre Virgem, Mãe de Deus e da Igreja de Jesus Cristo.
No fim do documento os Padres conciliares aprovaram e o Papa Paulo VI assinou com eles:

FÓRMULA DA PROMULGAÇÃO

Todas e cada uma das coisas que nesta Constituição dogmática se estabelecem, pareceram bem aos padres do Concílio. E nós ― pelo poder apostólico que nos foi confiado por Cristo ― juntamente com os veneráveis padres, no Espírito Santo as aprovamos, decretamos e estabelecemos, e tudo quanto assim conciliarmente foi estatuído, mandamos que, para glória de Deus, seja promulgado.
– Roma, junto de São Pedro, aos 21 de novembro de 1964.
Eu, Paulo, bispo da Igreja Católica(Seguem-se as assinaturas dos padres conciliares)

sábado, 20 de setembro de 2008

SANTA MARIA MÃE DE DEUS

Tornando-se homem, Cristo renova o homem.

Para venerar na verdade e cultuar com piedade o mistério da festa de hoje, é preciso, irmãos muito amados, não cometer erro algum a respeito da Encarnação do Senhor, nem admitir qualquer opinião indigna de sua divindade: há um perigo semelhante tanto em não reconhecer nele a verdade de nossa natureza, quanto em negar a igualdade de sua glória com a de seu Pai. Assim, quando nos aproximamos do mistério do nascimento de Cristo, no qual ele nasceu da Virgem Mãe, afastemos para bem longe de nós a escuridão dos raciocínios terrenos, e que a fumaça a sabedoria mundana se retire dos nossos olhos iluminados pela fé. Pois divina é a autoridade em que cremos, divina é a doutrina que seguimos.
Quer voltemos nosso ouvido interior para o testemunho da Lei, quer para os oráculos dos profetas ou para a proclamação do Evangelho, é sempre verdadeira a palavra que São João proferiu, cheio do Espírito Santo: No princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus (Jo 1, 1). E é igualmente verdade o que acrescenta o mesmo evangelista: O Verbo se fez carne e habitou entre nós; e nós vimos a sua glória, glória que ele tem junto do Pai como Filho único (Jo 1, 14). Em ambas as naturezas o Filho de Deus permanece ele mesmo, assumindo a nossa natureza sem perder a sua própria; tornando-se homem, renova o homem, permanecendo imutável em si mesmo.
A divindade, que ele tem em comum com o Pai, nada perdeu de seu poder supremo, nem a forma de servo violou a forma de Deus, porque a essência soberana e eterna, que se inclinou sobe o género humano para salvá-lo, nos transportou para a sua glória sem deixar de ser o que era. Assim, quando o Filho de Deus ora se reconhece inferior ao Pai, ora se diz igual a ele, indica que verdadeiramente reúne em si as duas naturezas: a inferioridade prova a natureza humana, a igualdade declara a natureza divina.
Por conseguinte, o nascimento do Filho de Deus na carne não lhe tirou nem acrescentou nada, pois a essência imutável não pode nem diminuir nem aumentar. O Verbo se fez carne não significa que a natureza divina se tenha mudado em carne, mas que a carne foi assumida pelo Verbo em unidade de pessoas. O termo “carne” exprime aqui o homem na sua totalidade, ao qual o Filho de Deus se uniu nas entranhas da Virgem fecundada pelo Espírito Santo e nunca destituída de sua virgindade. Essa união foi tão íntima que o que tinha sido gerado da essência do Pai fora do tempo é o mesmo que nasce, no tempo, do seio da Virgem. Não poderíamos ter sido libertos dos laços da morte eterna, caso não se tivesse humilhado na nossa condição aquele que permanecia todo poderoso na sua.


São Leão Magno, papa: Sermões
Sermo 7 in Nativitate Domini, 1-2
(Sources Chrétiennes 22, 136-138)

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

O QUE SIGNIFICA A VIRGINDADE DE MARIA

“Eis a tua Mãe”


Os dois primeiros capítulos dos evangelhos de São Mateus e de São Lucas afirmam claramente que Maria concebeu Jesus sem intervenção de varão: “o que nela foi concebido vem do Espírito Santo”, disse o anjo a São José (Mt 1, 20); e a Maria, que pergunta “Como se fará isso, pois não conheço homem?”, o anjo lhe responde: “O Espírito Santo descerá sobre ti, e a força do Altíssimo te envolverá com a sua sombra...” (Lc 1, 34-35). Por outro lado, o fato de Jesus na Cruz entregar sua Mãe aos cuidados de São João supõe que a Virgem não tinha outros filhos. Que os evangelhos mencionem em certos trechos os “irmãos de Jesus” pode explicar-se pelo uso do termo “irmãos” em hebraico com o sentido de parentes próximos (Gn. 13, 8; etc.). Outra hipótese seria supor que São José tivesse filhos de um matrimônio anterior (ver a pergunta: Casou São José uma segunda vez?). Também podemos considerar que o termo “irmãos” foi usado no sentido de membro do grupo de crentes, tal como é comum no Novo Testamento (cf. At 1, 15). A igreja sempre acreditou na virgindade de Maria, e a chama de “sempre virgem” (Lumen Gentium 52), antes, durante e depois do parto, como expressa uma fórmula tradicional.
A concepção virginal de Jesus deve ser entendida como obra do poder de Deus “porque a Deus nenhuma coisa é impossível” (Lc. 1, 37). Foge a toda compreensão e poder humanos. Não tem relação alguma com as representações mitológicas pagãs em que um deus se une a uma mulher realizando o papel do homem. A concepção virginal de Jesus é uma obra divina no seio de Maria similar à criação. Isso é impossível de aceitar para o não crente, como era para os judeus e pagãos, entre os quais se inventou histórias grosseiras acerca da concepção de Jesus, como a que a atribui a um soldado romano chamado Pantheras. Na verdade, esse personagem é uma ficção literária, sobre o qual se inventou uma lenda para zombar dos cristãos. Partindo do ponto de vista da ciência histórica e filológica, o nome Pantheras (ou Pandera) é uma corruptela que parodia a palavra parthénos (em grego: virgem). As pessoas, que utilizavam o grego como língua de comunicação em grande parte do império romano do oriente, ouviam os cristãos falarem de Jesus como o Filho da Virgem (huiós parthénou), e quando queriam zombar deles, chamavam-no de “filho de Pantheras”. Tais histórias, definitivamente, só testemunham que a Igreja sustentava a virgindade de Maria, ainda que parecesse impossível.
O fato de Jesus ter sido concebido virginalmente é um sinal de que Ele é verdadeiramente Filho de Deus por natureza — daí que não tenha um pai humano — e, ao mesmo tempo, verdadeiro homem nascido de mulher (Gl. 4, 4). Nas passagens evangélicas, mostra-se a absoluta iniciativa de Deus na história humana, para o advento da salvação, e também que esta se insere na própria história, como mostram as genealogias de Jesus.
Pode-se compreender melhor a Jesus, concebido pelo Espírito Santo e sem intervenção de homem, como o novo Adão que inaugura uma nova criação. A ela pertence o homem novo redimido por Cristo (1 Cor 15, 47; Jb. 3, 34).
A virgindade de Maria, além do mais, é sinal de sua fé sem vacilações e de sua entrega plena à vontade de Deus. Inclusive, diz-se que, por essa fé, Maria concebe a Cristo antes em sua mente que em seu ventre, e que “é mais bem-aventurada ao receber Cristo pela fé, que ao conceber em seu seio a carne de Cristo” (Santo Agostinho). Sendo virgem e mãe, Maria é também figura da Igreja e sua mais perfeita realização.


Gonzalo Aranda


BIBLIOGRAFIA
Catecismo de la Iglesia Católica, nn. 484-511.
VARO, Francisco. Rabí Jesús de Nazaret (B.A.C., Madrid, 2005) pp. 212-219.

domingo, 14 de setembro de 2008

VERDADEIRA DEVOÇÃO I

A verdadeira devoção à Santíssima Virgem


Foi pela Santíssima Virgem Maria que Jesus Cristo veio ao mundo e é também por Ela que deve reinar no mundo.
Durante a vida, Maria permaneceu muito oculta. É por isso que o Espírito Santo e a Igreja lhe chamam ALMA MATER, Mãe escondida e secreta. A sua humildade foi tão profunda, que não teve na terra atrativo mais poderoso nem mais contínuo que o de se esconder a si mesma e a toda a criatura, para que só Deus a conhecesse.
A fim de atender aos pedidos que Ela lhe fez, para que a ocultasse, empobrecesse e humilhasse, aprouve a Deus, oculta-la na sua conceição e nascimento, na sua vida, mistérios, ressurreição e assunção, aos olhos de quase toda criatura humana. Seus próprios pais não a conheciam, e os anjos perguntavam muitas vezes entre si: “Quae est ista? Quem é esta?”, porque o Altíssimo lha escondia ou, se alguma coisa lhes revelava a seu respeito, infinitamente mais lhes ocultava.
Deus Pai consentiu em que Ela não fizesse milagres em vida, pelo menos não manifestos, embora lhe tivesse dado poder para isso. Deus Filho permitiu que quase não falasse, embora tendo-lhe comunicado a sua sabedoria. Deus Espírito Santo deixou que os seus Apóstolos e Evangelistas falassem muito pouco sobre Ela, apenas o necessário para dar a conhecer Jesus Cristo, apesar de Ela ser a sua esposa fiel.
Maria é a obra-prima por excelência do Altíssimo, cuja posse e conhecimento Ele reservou para si. “Maria é a Mãe admirável do Filho o qual quis humilhá-la e escondê-la durante a vida para favorecer a sua humildade.” Para este fim tratava-a pelo nome de “mulher”, como a uma estranha, embora no seu coração a estimasse mais do que a todos os anjos e a todos os homens. Maria é a fonte selada e a esposa do Espírito Santo, onde só Ele tem entrada. Maria é o santuário e o repouso da Santíssima Trindade, onde Deus está mais magnífica e divinamente que em qualquer outro lugar do universo, sem excetuar a sua morada acima dos querubins e serafins. Neste santuário nenhuma criatura, por mais pura que seja, pode entrar a não ser por grande privilégio.
(…)
Foi o meu coração que ditou o que acabo de escrever com particular alegria, a fim de mostrar como Maria Santíssima tem sido insuficientemente conhecida até agora e como é esta uma das razões por que Jesus Cristo não é conhecido como deve ser.
Se é certo que o conhecimento e o reino de Jesus Cristo se estabelecerá no mundo, não será mais que uma conseqüência necessária do conhecimento do reino da Santíssima Virgem Maria. Ela deu Jesus Cristo ao mundo a primeira vez, e há de fazê-lo resplandecer também segunda vez.


São Luís Maria de Montfort

VISITAÇÃO I

“Donde me vem esta graça
de que a mãe do meu Senhor venha até mim?”


"Tu és bendita entre as mulheres e o fruto do teu ventre é bendito. Donde me vem esta graça de que a mãe do meu Senhor venha até mim?" Estas palavras: "Donde me vem esta graça?" não são sinal de ignorância como se Isabel, toda cheia do Espírito Santo, não soubesse que a mãe do Senhor tinha vindo até ela de acordo com a vontade de Deus. Eis o sentido das suas palavras: "Que fiz eu de bom? Em que é que as minhas obras são tão importantes que a mãe do Senhor venha ver-me? Serei uma santa? Que perfeição, que fidelidade me mereceram esta graça, a visita da mãe do Senhor?" "Porque ainda a tua voz não tinha aflorado os meus ouvidos e já o meu filho exultava de alegria no meu seio". Ele tinha sentido que o Senhor viera para santificar o seu servo ainda antes do seu nascimento.
Pode acontecer que me chamem louco os que não têm fé por eu ter acreditado nestes mistérios!... Porque o que é considerado loucura por essa gente é para mim ocasião de salvação. Na verdade, se o nascimento do Salvador não tivesse sido celeste e bem-aventurado, se não tivesse tido nada de divino e de superior à natureza humana, nunca a sua doutrina teria atingido toda a terra. Se, no seio de Maria, tivesse havido apenas um homem e não o Filho de Deus, como teria sido possível que nesse tempo, e ainda hoje, fossem curadas todas as espécies de doenças, não só do corpo mas também da alma?... Se reunirmos tudo o que se diz acerca de Jesus, podemos constatar que tudo o que foi escrito a seu respeito é considerado divino e digno de admiração, porque o seu nascimento, a sua educação, o seu poder, a sua Paixão, a sua Ressurreição não são apenas factos que ocorreram naquele tempo: eles agem em nós ainda hoje.


Orígenes (c. 185-253), presbítero e teólogo 7ª homilia sobre S. Lucas

sábado, 13 de setembro de 2008

CONSAGRAÇÃO DO MUNDO

“Como pedi a Santa Margarida Maria”

Primeiro pedido de consagração do mundo


Importantíssima carta esta, pois nela relata a Beata Alexandrina ao seu Director espiritual o primeiro pedido de consagração do Mundo ao Coração Imaculado de Maria, que Jesus lhe dirigiu. Ele sente a importância desta comunicação e por isso mesmo “não pode passar aquele dia sem lhe dizer alguma coisa”, mesmo se “está de tal forma que mal pode falar”.
Alexandrina começa por indicar o dia em que este pedido foi feito : “No dia trinta, depois da Sagrada Comunhão”. Trata-se do dia 30 de Julho desse mesmo ano 1935.
Jesus não entra logo no “vivo do sujeito”, mas começa por saudá-la de maneira alegre, mesmo jovial : — “Minha filha, ó minha querida rainha, a que alturas te levei, esposa do Rei Sacramentado”. Depois, queixa-se da humanidade e pede à esposa amada que “enquanto vives pede-me pelos ceguinhos, pelos pobres pecadores”.
Várias vezes Jesus lhe dirá, como aqui, que “está à espera de almas que lhe dediquem um amor como tu, mas não as tenho. Sou tão desprezado ! Mas não é só isso, sou tão ofendido ! Tem pena do teu Jesus, meu anjo, meu amor !”
« Vem depois, o grande pedido, que se renovará muitas vezes, até ser concretizado : a consagração do mundo ao Coração Imaculado de Maria.
“Manda dizer ao teu pai espiritual que, em prova do amor que dedicas a Minha Mãe Santíssima, quero que seja feito todos os anos um acto de Consagração do mundo inteiro”.
Obediente como sempre, Alexandrina mandou dizer ao seu Paizinho espiritual o que Jesus acabava de lhe pedir, mas não foi ouvida, como no-lo confirma o Padre Mariano Pinho, então seu Director espiritual :
« Não ligámos por então importância a esta parte da carta, pois era a época, como ela afirma acima, dos mimos e das consolações espirituais, e são tão fáceis nessas circunstâncias os equívocos e enganos a respeito do que se experimenta na alma... » [1]
« Convém também ter presente — lembra o professor José Ferreira, e com razão — que, embora viesse de Jesus, o pedido impunha uma tarefa ingente : mobilizar o Papa e com ele toda a Igreja ! E isto na base do pedido duma ignorada paralítica a viver numa desconhecida paróquia rural dum pequeno país ».
Esta consagração anual deveria, segundo os desejos e instruções de Jesus, realizar-se “num dos dias das suas festas, escolhido por” Alexandrina : “Assunção, Purificação ou Anunciação”. Na cerimónia mundial organizada pela hierarquia da Igreja, o clero e os fieis deveriam pedir “à Virgem sem mancha de pecado que envergonhe e confonda os impuros, para que eles arredem caminho e não ofendam” mais Jesus.
Uma outra indicação interessante sobre esta consagração, encontramo-la ainda na mesma mensagem de 30 de Julho de 1935:
“Assim, como pedi a Santa Margarida Maria para ser o mundo consagrado ao Meu Divino Coração, assim peço-te a ti para que seja consagrado a Ela com uma festa solene”. »[2]


* * * * *


« Balasar, 1 de Agosto de 1935
Viva Jesus !
Meu P.
Estou de tal forma que mal posso falar ; mesmo assim, não posso passar este dia sem lhe dizer alguma coisa, enquanto o meu bom Jesus me for dando algum sopro de vida.
Ainda não deixei dia nenhum de receber o meu querido Jesus em minha pobre alma. Como Ele é tão bom para mim ! Concedeu-me esta graça tão grande sem eu merecer : Se ao menos, eu lhe soubesse corresponder ! Pobre de mim, que não sei. Não o amo tanto como desejo nem como Nosso Senhor é digno de ser amado. Parece que tudo vai acabar ; já rezo tão pouquinho ! Não tenho forças para o fazer. Hoje confessei-me, fiquei tão desanimada ! Nosso Senhor não me abandone, pela sua infinita misericórdia. Se Ele estiver comigo, tudo venço sem dificuldades ; o que eu quero é sofrer muito, muito pelo meu amado Jesus, e o que eu queria era que Ele não fosse ofendido. Mas que horror ! Como se ofende tão gravemente ! Que pena eu tenho do meu querido Jesus !
No dia trinta, depois da Sagrada Comunhão, sentia-me muito bem com Nosso Senhor, sentia uma grande união com Ele. Passados alguns momentos ouvi que Ele me chamava :
— Minha filha, ó minha querida rainha, a que alturas te levei, a esposa do Rei Sacramentado. Continua, minha querida filha, a tua breve missão : enquanto vives pede-me pelos ceguinhos, pelos pobres pecadores. Ainda tens muitos para conduzires aos teus caminhos. Eu sou o caminho, a verdade e a vida, conduz-mos para que Eu seja amado. Não me deixes nem um momento sozinho nos meus sacrários. E estou à espera de almas que me dediquem um amor como tu, mas não as tenho. Sou tão desprezado ! Mas não é só isso, sou tão ofendido ! Tem pena do teu Jesus, meu anjo, meu amor! Cura com a tua reparação esta lepra tão contaminosa. Manda dizer ao teu pai espiritual que, em prova do amor que dedicas a Minha Mãe Santíssima, quero que seja feito todos os anos um acto de Consagração do mundo inteiro, num dos dias das suas festas, escolhido por ti : Assunção, Purificação ou Anunciação, pedindo à Virgem sem mancha de pecado que envergonhe e confunda os impuros, para que eles arredem caminho e não me ofendam. Assim, como pedi a Santa Margarida Maria para ser o mundo consagrado ao Meu Divino Coração, assim peço-te a ti para que seja consagrado a Ela uma festa solene.
Sentia as carícias de Nosso Senhor de que já tenho falado a Vossa Reverência e dizia-me Nosso Senhor :
― Não te descuides com a tua tarefa. Manda-lhe dizer tudo que ele te mandará ordens.
Hoje mesmo, recebi a notícia que por estes dias ia receber a visita da minha irmãzinha da Sertã : fiquei imensamente satisfeita.
Muitas lembranças da minha mãe e da Deolinda ; digo-lhe e peço para me não esquecer junto de Nosso Senhor que eu continuo a fazer o mesmo. Abençoe, por caridade, a pobre,

Alexandrina Maria da Costa. »[3]

—*—*—


[1] Padre Mariano Pinho: “No Calvário de Balasar”, cap. 10.
[2] Afonso Rocha : “Junto do altar do Sagrado Coração de Jesus” ; Reims (França) Junho de 2007.
[3] Carta ao Padre Mariano Pinho : 1 de Agosto de 1935.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

CINCO PRIMEIROS SABADOS

Comunhão Reparadora nos Primeiros Sábados
Cinco Primeiros Sábados


I – A DEVOÇÃO DOS PRIMEIROS SÁBADOS


Na Aparição do dia 13 de Julho anunciou Nossa Senhora em Fátima: “Para impedir a guerra virei pedir a consagração da Rússia ao meu Imaculado Coração e a Comunhão reparadora nos Primeiros Sábados”.
Esta última devoção veio pedi-la, aparecendo à Irmã Lúcia a 10-12-1925, em Pontevedra, Espanha. Disse então: “Olha, minha filha, o meu coração cercado de espinhos que os homens ingratos a todos os momentos me cravam com blasfémias e ingratidões. Tu, ao menos, procura consolar-me e diz que prometo assistir na hora da morte, com todas as graças necessárias para a salvação, a todos os que, no Primeiro Sábado de cinco meses seguidos, se confessarem, receberem a Sagrada Comunhão, rezarem um terço e me fizerem companhia durante quinze minutos, meditando nos 15 mistérios do Rosário com o fim de me desagravar”.Nª Senhora mostrou o seu Coração rodeado de espinhos, que significam os nossos pecados. Pediu que fizéssemos actos de desagravo para Lhos tirar, com a devoção reparadora dos cinco Primeiros Sábados. Em recompensa, promete-nos "todas as graças necessárias para a salvação”.
Jesus nos dois anos seguintes, 15 de Fevereiro de 1926 e 17 de Dezembro de 1927, insiste para que se propague esta devoção. Lúcia escreveu: “Da prática da devoção dos Primeiros Sábados, unida à consagração ao Imaculado Coração de Maria, depende a guerra ou a paz do mundo”.


II – CINCO, POR QUÊ?


São cinco os Primeiros Sábados por, segundo revelou Jesus, serem “cinco as espécies de ofensas e blasfémias proferidas contra o Imaculado Coração de Maria.
1. – As blasfémias contra a Imaculada Conceição, 2. – Contra a sua Virgindade ; 3. – Contra a Maternidade Divina, recusando ao mesmo tempo recebê-la como Mãe dos homens ; 4. – Os que procuram infundir nos corações das crianças a indiferença, o desprezo e até o ódio contra esta Imaculada Mãe ; 5. – Os que A ultrajem directamente nas suas sagradas imagens”.


III – CONDIÇÕES


As condições para ganhar o privilégio dos Primeiros Sábados são quatro:
1. Confissão. Para cada Primeiro Sábado é precisa uma confissão com intenção reparadora. Pode fazer-se em qualquer dia, antes ou depois do Primeiro Sábado, contanto que se receba a Comunhão em estado de graça.
A vidente perguntou: – “Meu Jesus, as (pessoas) que se esquecerem de formar essa intenção (reparadora)? Jesus respondeu – Podem formá-la na confissão seguinte, aproveitando a primeira ocasião que tiverem para se confessar”.
As outras três condições devem cumprir-se no próprio Primeiro Sábado, a não ser que algum sacerdote, por justos motivos, conceda que se possam fazer no domingo a seguir.
2. A Comunhão Reparadora.
3. O Terço.
4. A meditação, durante 15 minutos, de um só mistério, de vários ou de todos. Também vale uma meditação ou explicação de 3 minutos antes de cada um dos 5 mistérios do terço que se está a rezar.
Em todas estas quatro práticas deve-se ter a intenção de desagravar o Imaculado Coração de Maria.
A devoção dos 5 Primeiros Sábados foi aprovada pelo Bispo de Leiria a 13-9-1939, em Fátima.


ACTO DE CONSAGRAÇÃO E DESAGRAVO


Virgem Santíssima e Mãe nossa querida, ao mostrardes o vosso Coração cercado de espinhos, símbolo das blasfémias e ingratidões com que os homens ingratos pagam as finezas do vosso amor, pedistes que Vos consolássemos e desagravássemos.
Ao ouvir as vossas amargas queixas, desejamos desagravar o vosso doloroso e Imaculado Coração que a maldade dos homens fere com os duros espinhos dos seus pecados.
Dum modo especial Vos queremos desagravar das injúrias sacrilegamente proferidas contra a vossa Conceição Imaculada e Santa Virgindade. Muitos, Senhora, negam que sejais Mãe de Deus e nem Vos querem aceitar como terna Mãe dos homens. Outros, não Vos podendo ultrajar directamente, descarregam nas vossas sagradas imagens a sua cólera satânica. Nem faltam também aqueles que procuram infundir nos corações das crianças inocentes, indiferença, desprezo e até ódio contra Vós.
Virgem Santíssima, aqui prostrados aos vossos pés, nós Vos mostramos a pena que sentimos por todas estas ofensas e prometemos reparar com os nossos sacrifícios, comunhões e orações tantas ofensas destes vossos filhos ingratos.
Reconhecendo que também nós, nem sempre correspondemos às vossas predilecções, nem Vos honrámos e amámos como Mãe, suplicamos para os nossos pecados misericordioso perdão.
Para todos quantos são vossos filhos e particularmente para nós, que nos consagramos inteiramente ao vosso Coração Imaculado, seja-nos ele o refúgio durante a vida e o caminho que nos conduza até Deus. Assim seja.


Cinco, porquê?


O Padre José Bernardo Gonçalves (1894-1966) propôs em Maio de 1930 à Irmã Lúcia, de quem foi confessor, seis perguntas para as quais pedia esclarecimento.
Eis o que se refere à quarta, com a respectiva resposta dada por escrito:
« Porque hão-de ser ‘5 sábados’ e não 9 ou 7 em honra das dores de Nossa Senhora ?
Ficando na capela com Nosso Senhor parte da noite do dia 29 para 30 deste mês de Maio de 1930, e falando a Nosso Senhor das duas perguntas 4.ª e 5.ª, senti-me de repente possuída intimamente da divina presença; e, se não me engano, foi-me revelado o seguinte :
‘Minha filha, o motivo é simples: são 5 as espécies de ofensas e blasfémias contra o Imaculado Coração de Maria:
1.ª – As blasfémias contra a Imaculada Conceição.
2.ª – Contra a Sua virgindade.
3.ª – Contra a Maternidade Divina, recusando, ao mesmo tempo, recebê-La como Mãe dos homens;
4.ª – Os que procuram publicamente infundir, nos corações das crianças, a indiferença, o desprezo, e até o ódio para com esta Imaculada Mãe ;
5.ª – Os que A ultrajam directamente nas suas sagradas Imagens.
Eis, Minha filha, o motivo pelo qual o Imaculado Coração de Maria Me levou a pedir esta pequena reparação; e, em atenção a ela, mover a minha misericórdia ao perdão para com essas almas que tiveram a desgraça de A ofender».
Primeira ofensa: negação da Imaculada Conceição.
A 8 de Dezembro de 1854, definiu o Papa Pio IX : « Declaramos, pronunciamos e definimos, que a doutrina que sustenta que a bem-aventurada Virgem Maria, no primeiro instante da sua Conceição, foi por graça e privilégio singular de Deus Todo-Poderoso... preservada e imune de toda a mancha do pecado original, foi revelada por Deus e como tal deve ser firme e constantemente acreditada por todos os fiéis ».
Recusam este privilégio várias confissões protestantes, os racionalistas, e implicitamente aqueles que negam o pecado original, pois que a Imaculada Conceição é precisamente a isenção dessa mancha, que em tal hipótese não existiria.
Segunda ofensa: negação da Virgindade perpétua de Maria.
A 6 de Novembro de 1982 disse João Paulo II no Santuário do Pilar em Saragoça, Espanha : « De modo virginal ‘sem intervenção de varão, e por obra do Espírito Santo, Maria deu a natureza humana ao Filho Eterno do Pai. De modo virginal nasceu de Maria um corpo santo. É a fé que...o Papa Paulo IV articulava na forma ternária de Virgem ‘antes do parto, no parto e perpetuamente depois do parto’. É a mesma que ensina Paulo VI: ‘Cremos que Maria é Mãe sempre Virgem do Verbo encarnado ».
Opõem-se a esta verdade os que negam que a Conceição e o parto de Jesus não foram virginais, e que Maria não conservou no parto a sua integridade, assim como aqueles que afirmam que Ela teve mais filhos além de Jesus.
Terceira ofensa: negação da maternidade divina e espiritual de Maria.
Declarou o III Concílio de Constantinopla no ano de 680 : « Nosso Senhor Jesus Cristo – nasceu do Espírito Santo e de Maria Virgem, que é, segundo a humanidade, própria e verdadeiramente Mãe de Deus».
É também Mãe espiritual dos homens, pela sua participação no Mistério da Encarnação e Co-redenção.
Quarta ofensa: ódio para com a Imaculada Mãe de Deus.
A ideologia Marxista-comunista procurou eliminar todos os vestígios de religião, a começar pelas crianças. O Ministério da Educação soviética declarou nesses tempos : « A educação comunista tem como fim principal eliminar todos os vestígios da religião ». Ensinava-se às crianças o racionalismo puro e, além disso, em certa nação, os pequeninos aprendiam « ladaínhas » de injúrias contra a Mãe de Deus.
Quinta ofensa: ultrajes às sagradas imagens.
Chegou-se ao descaramento de destruir e ultrajar as imagens de Nossa Senhora, sobretudo quando expostas em público. Certamente também desgostam a Maria Santíssima aqueles que tiram dos templos as suas imagens ou as reduzem ao mínimo, contrariando o Concílio Vaticano II. « Observem religiosamente aquelas coisas que nos tempos passados foram decretadas acerca do culto das imagens de Cristo, da Bem-aventura Virgem e dos Santos ».
São estas cinco ofensas a Maria que devemos reparar nos cinco primeiros sábados.


Textos P. Fernando Leite, sj

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

VIRGINDADE DE MARIA

Como explicar um mistério?

Nem sempre é fácil de argumentar sobre as dificuldades que encontramos na Bíblia Sagrada em geral e mais particularmente nos Livros do Novo Testamento. Uma dessas dificuldades é a virgindade perpétua de Maria Santíssima, depois de ter dado à luz Jesus, nosso Salvador e “Deus connosco”.
O assunto que vamos aqui tratar é portanto delicado, mas nós contamos com a bondade do divino Espírito Santo e o benefício das suas divinas inspirações.
Há quem afirme a quem os queira ouvir que “Maria é uma mulher como as outras” e que, depois de ter dado à luz Jesus Cristo, teve outros filhos.
Chamaremos a isto raciocinar sem reflectir e mesmo, ousaremos afirmar que isso é mesmo falta de conhecimentos bíblicos, e não só...
Vejamos pois o que a este respeito podemos dizer e explicar:
No capítulo 7, versículo 14 do Livro do profeta Isaías, este mesmo profeta, inspirado por Deus, diz: « Eis que uma virgem conceberá e dará à luz um Filho e o Seu Nome será Emanuel ».
O profeta designa este acontecimento ― a Virgem conceber a dar à luz ― como um extraordinário sinal de Deus: o sinal da vinda do Salvador, Emanuel, Deus connosco. Mais ainda, o sinal da tão esperada e desejada vinda do tempo de Redenção do género humano.
Como não deveria ser assim? Seria porventura algum prodígio, um sinal maravilhoso, uma mulher ter um filho deixando de ser virgem?
Claro que não, responderão, e com razão, visto ser uma evidência.
Devemos pois admitir que o grande sinal ― sinal extraordinário, não duvidemos ― seria uma Virgem conceber e dar à luz, permanecendo virgem. Ora, Maria é a Mãe de Jesus, nosso Salvador. Eis porque Ela é a Virgem anunciada e descrita por Isaías, é a Virgem que concebeu e deu à luz, permanecendo Virgem: “conceberá e dará à luz”.

O que São Mateus explica...

O sentido desta profecia de Isaías é confirmado pelo Evangelho de São Mateus, no capítulo 1, versículo 18 e seguintes:
« Ora, o nascimento de Jesus Cristo foi assim: Maria, sua mãe, estava desposada com José; antes de coabitarem, notou-se que tinha concebido pelo poder do Espírito Santo. José, seu esposo, que era um homem justo e não queria difamá-la, resolveu deixá-la secretamente. Andando ele a pensar nisto, eis que o anjo do Senhor lhe apareceu em sonhos e lhe disse: “José, filho de David, não temas receber Maria, tua esposa, pois o que ela concebeu é obra do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho, ao qual darás o nome de Jesus, porque Ele salvará o povo dos seus pecados”.
Tudo isto aconteceu para se cumprir o que o Senhor tinha dito pelo profeta: “Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho; e hão-de chamá-lo Emanuel, que quer dizer: Deus connosco”. »
Por aqui se vê que a profecia de Isaías começava a realizar-se: um grande sinal anunciava a vinda do Salvador: a Virgem conceberá, por obra do Espírito Santo; e, permanecendo Virgem, dará à luz; “e o nome da Virgem era Maria”.

E São Lucas também...

Numa delicada mas não velada descrição, São Lucas nos persuade que Maria conservou a integridade da sua virgindade a quando do nascimento de Jesus. Vamos ler com a devida atenção, no capítulo 2 de seu Evangelho, os versículos 6 e 7:
« E, quando eles ali se encontravam (em Belém), completaram-se os dias de ela dar à luz e teve o seu filho primogénito, que envolveu em panos e recostou numa manjedoura, por não haver lugar para eles na hospedaria. »
É necessário notarmos aqui que Maria tendo sido exempta, por graça especial de Deus, do pecado original, ficou também exempta das dores do parto que acompanham o nascimento de todos os nossos filhos, eis porque foi Ela mesma que lavou o Menino, o seu filho primogénito e o “envolveu em panos e recostou numa manjedoura”. Se assim não fosse, São Lucas não poderia ter falado assim, se Maria tivesse dado à luz de modo natural, como as outras mães.
Alguém poderá dizer que até agora só conseguimos provar que Maria foi virgem até ao nascimento de Jesus, mas que nada ficou provado ainda, que possa confirmar que Ela continuou a sê-lo após o nascimento do seu Filho primogénito. Nada prova, por enquanto, que Ela não tenha tido outros filhos.

A quando da anunciação

Vejamos o que nos dizem os Evangelhos.
No Evangelho de São Lucas, logo no início, quando o Evangelista nos conta a visita do Anjo Gabriel e nos transmite o diálogo instaurado entre Ele e a Virgem, podemos ler uma objecção feita por Maria ao divino Mensageiro, quando este lhe anunciou que Ela iria ser a Mãe do Messias:
« Como se fará isso, se eu não conheço homem? » (Lc. 1, 34)
Sabemos que já nesta ocasião Maria estava comprometida com José, daí se pode razoavelmente deduzir que Ela tenha feito voto de castidade perpétua, voto este que José terá obviamente aceitado. Senão, o Anjo teria certamente respondido o que nos parece mais judicioso: “Não conheceste varão até agora, mas conhecerás depois”. Que sentido teria a pergunta de Maria, se Ela tivesse intenção de levar uma vida conjugal normal com José?
Não teria nenhum sentido, podemos justamente afirmar.
Podemos também conjecturar que seria conveniente que o Filho Unigénito de Deus fosse também, segundo a carne, o Filho Unigénito de Maria.

Os “irmãos do Senhor”

As dificuldades continuam todavia: a leitura superficial da Sagrada Escritura parece indicar-nos que Maria teve outros filhos, visto que nela se afirma, no Evangelho de São Marcos, por exemplo que Jesus tinha irmãos. Leiamos o trecho:
« Não é Ele o carpinteiro, o filho de Maria e irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão? » (Mc. 6, 3)
A Bíblia indica pois aqui que Jesus teria quatro irmãos... Mas será mesmo assim ?
A resposta é categoricamente: não. Eis porque razão: no mesmo Livro Sagrado podemos encontrar os nomes do pai e da mãe dos três primeiros: de Tiago, de José, de Judas. E estes nomes não são de maneira nenhuma aqueles de Maria e de José, seu esposo.
Continuemos pois a nossa pesquisa...

São Tiago, o Menor

Comecemos por São Tiago. Na sua Epístola aos Gálatas, capítulo 1 et versículo 19, São Paulo diz: « Dos outros apóstolos não vi mais nenhum, a não ser Tiago, irmão do Senhor. » Sabe-se que este Tiago é Tiago, o Menor, cuja mãe é uma das mulheres chamada, Maria que estavam no Calvário, quando da morte de Jesus, como relata São Marcos capítulo 15, versículo 40: « Encontravam-se também ali algumas mulheres que observavam de longe, entre elas estavam Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago Menor e de José. »
Sabe-se igualmente que o pai de Tiago, o Menor é Alfeu, como no-lo afirma São Mateus, capítulo 10, versículo 3, no Evangelho por ele escrito, quando enumera os discípulos de Jesus: « Tiago, filho de Alfeu ». Pode pois afirmar-se que Tiago, o Menor é filho de uma mulher chamada Maria e de Alfeu, mas de maneira nenhuma de Maria, Mãe de Jesus e de José, o Carpinteiro. Igualmente se pode afirmar categoricamente que este Tiago não é “irmão de Jesus”.

José e Judas, filhos de Alfeu

Outra certeza, José — também nomeado acima — é irmão carnal de Tiago: ambos são filhos de uma das mulheres chamada Maria que estavam no Calvário e também de Alfeu, conforme a citação de São Marcos, dada acima. Logo, José não é irmão carnal de Jesus. Judas é também irmão de Tiago, pois assim começa a sua Epístola: « Judas, servo de Jesus Cristo e irmão de Tiago... » Seu pai é também Alfeu. Por conseguinte, Judas não é “irmão de Jesus”.
Mas, dos quatro citados, um nos falta: Simão.

Simão, quem é ele?

Os textos do Novo Testamento não nos dão qualquer outra informação sobre este Simão, mas é permitido deduzir que os outros três não sendo “irmãos de Jesus”, não há qualquer razão para que este o seja.
Um conceituado historiador do século II, Hegezipo informa que Simão é filho de Cleófas, esposo de Maria, aquela que João no seu Evangelho (19, 25) afirma ser “irmã da Mãe de Jesus”. Logo, Simão é primo de Jesus, e se é primo, não pode ser irmão carnal de Jesus.
Para corroborar o que até aqui afirmámos, podemos dizer que nos Textos Sagrados, não se encontra uma só frase ou indicação que permita deduzir que Maria tivesse tido outros filhos, ao contrário, só Jesus é chamado na Bíblia Sagrada “o Filho de Maria”, com artigo, no texto original, Marcos 6, 3: « Não é Ele o carpinteiro, o filho de Maria? »

Será que Bíblia contém erros?

Não, a Bíblia Sagrada não contem o menor erro. As pessoas é que erram ao interpretar a Bíblia de qualquer maneira. O termo "irmão" (ah, em hebraico, adelphós, em grego) designa na linguagem dos hebreus não somente os filhos do mesmo pai ou da mesma mãe (como Caim e Abel, Esaú e Jacob, S. Tiago Maior e S. João Evangelista), mas também um familiar ou parente próximo, como tios e sobrinhos, pois, o hebraico não possui termos próprios para designar estes parentescos. A Bíblia Sagrada está cheia de exemplos do emprego da palavra “irmão” neste segundo sentido. Assim, por exemplo, vejamos em Génesis, cap.13, vers.8: Aqui, Abraão chama Lot de irmão; no entanto, em Génesis, cap.12, vers.5 e cap.11 vers.28, vemos que Lot é, de facto, sobrinho de Abraão. Outro exemplo: Labão chama irmão a Jacob, está em Génesis, 29, 15; mas Jacob era seu sobrinho, como narra o Génesis, 29, 13. Mas estes exemplos não são os únicos; encontramos outros em Levítico, 10, 4; e Crónicas, 23, 22). Então, estes “irmãos de Jesus”, nada mais são de facto que seus parentes, ou seus primos.
Não terminam aqui as dificuldades que sobre este delicado assunto encontramos nos Livros Santos, pois outra dificuldade nos surge normalmente: No seu Evangelho São Lucas, capítulo 2, versículo 7, atribui a Jesus o titulo de primogénito, o que supõe outros filhos de Maria: « e (Maria) teve o seu filho primogénito ».

Filho primogénito

Pensar que esta expressão significa que Maria teria tido outros filhos depois de Jesus é induzir-se num erro que demonstra uma evidente ignorância bíblica e o desconhecimento do verdadeiro significado de certas expressões hebraicas. Este desconhecimento pode tornar-se um obstáculo a uma verdadeira compreensão dos textos que lemos e que de boa fé, certamente, pensamos ter bem assimilado. Mas os termos bíblicos nem sempre são interpretados com a verdadeira exactidão e são origem de erros, algumas vezes graves.
Vejamos um pouco este problema:
“Primogénito” — por exemplo — é um termo jurídico da Bíblia que tem significação determinada: é o primeiro filho, quer venha outro, quer não. De facto, a Bíblia Sagrada afirma que todo primogénito pertence, de modo especial, ao Senhor. Veja-se, em Êxodo capítulo 34, 19; 13, 12. E ele devia cumprir, logo nos primeiros meses, a lei do resgate, como vem explicado em Números 18, 16. Não se esperava pelo segundo filho para que o primeiro fosse tido e tratado como primogénito a vida toda. Recentemente os arqueólogos descobriram o túmulo de uma judia do século I, nele estava a inscrição: “Aqui jaz Arsinoé, morta ao dar à luz o seu primogénito”. Significativo? Não!

“José não a conheceu até que...”

Uma outra dificuldade aparente encontramo-la no Evangelho de São Mateus, 1, 25, onde está escrito:
« José não a conheceu até que Ela deu à luz. » Poderia pensar-se que esta expressão quer dizer que ele a conheceu depois d’Ela ter dado à luz. Mas pensar assim seria demonstrar uma falta de conhecimento da língua hebraica. Isto confirma o que acima dissemos já: É impossível a pessoa compreender o sentido de um texto antigo, sem que (até que) tenha um certo conhecimento da língua original do texto.
Saber recitar a Bíblia de cor é certamente bom, mas conhecer o significado dos termos ou expressões nela utilizados nos parece talvez mais importante ainda.
Porquê?
É útil saber que os Evangelhos e a maior parte das Cartas e Documentos da época logo após a morte de Jesus, foram escritos em grego e aramaico, o que significa que a interpretação bíblica é praticamente impossível sem o conhecimento dos idiomas: hebraico, aramaico e grego.
Vejamos um exemplo concreto:
A expressão “até que” é um hebraísmo, e significa “sem que”. Significa então que Maria deu à luz sem que José a tivesse conhecido; porquanto Jesus é o Filho de Deus e não de José; e Maria fizera voto de virgindade.
São numerosos os exemplos destes hebraísmos na Bíblia.
Apenas um, para não nos estendermos: “O coração do justo está firme e não temerá até que veja confundidos seus inimigos”. Este é o versículo 8 do Salmo 111. Ora, se não temeu antes, não temerá depois. O sentido da frase é: os inimigos serão confundidos sem que o coração do justo tema. Assim, Mateus quis apenas afirmar que Maria concebeu sem que José a tivesse conhecido.
Para que não restem dúvidas, é possível consultar na Sagrada Escritura outros exemplos, que não citaremos mas apenas indicaremos as referências:
Deuteronómio 7, 24; Sabedoria 10, 14; Salmo 56, 2; Isaías 22, 14; Mateus 5, 18.

Esta verdade que a Igreja Católica defende...

Quando verificamos todos estes trechos e que todos eles provam e confirmam a virgindade perpétua de Nossa Senhora, a nossa Bendita Mãe, parece-nos impossível que nestes tempos em que vivemos existam ainda crentes ― e mesmo católicos ― que neguem uma tal verdade dogmática.
Não podemos pensar que se trate de má fé ― a caridade cristã proscreve o julgamento temerário, por ser uma falta de caridade ― mas simplesmente de uma falta de cultura bíblica e mesmo linguística. No que nos compete aqui frisar e afirmar com força e firmeza é que Maria não foi nem é “uma Mulher como as outras”, mas sim a Mãe de Jesus, a Mãe de Deus e nossa Bendita Mãe igualmente.
Não sejamos, nem uns nem outros, pobres cegos obstinados, porque é bem verdade que não há maior cego do que aquele que não quer ver.
Esta verdade que a Igreja Católica defende desde há séculos, não é uma invenção de sacerdotes “devotos” ou de Papas “místicos”, mas uma verdade que implica a Sabedoria e a Misericórdia divinas cujo Amor não tem de igual que a própria Trindade Santíssima.
Podemos também encontrar vestígios desta verdade nos textos dos Padres da Igreja, sobretudo aqueles que viveram logo após os Apóstolos. Um deles, Santo Irineu de Lyon, discípulo de São Policarpo que foi ele mesmo discípulo de São João Evangelista, afirma na sua obra-prima, “Contra as heresias”: « Quem jamais, em tempo algum, ousou pronunciar o nome de Maria sem lhe juntar o qualificativo de Virgem? » (Adv. Haeres.78, pág.42,706)
Outros Padres e Doutores da Igreja e mesmo Concílios, trataram estas dificuldades e demonstraram que na verdade a nossa Mãe do Céu era Virgem antes do nascimento de Jesus e continuou a sê-lo depois.

Conclusão

Concluindo este humilde trabalho, devemos recordar e frisar, para que não esqueça, que São José não conheceu Maria nem antes nem depois do nascimento do seu “primogénito”; que Jesus é o único que nos Evangelhos é chamado “Filho de Maria”; que Tiago, José, Judas e Simão não são “irmãos do Senhor”, mas simplesmente parentes ou primos.
Um dos nossos amigos, excelente e humilde sacerdote, deu-nos uma outra ideia que prova igualmente esta verdade. Diz ele:
« É o próprio Jesus que nos dá a melhor prova, quando antes de morrer na Cruz se dirige a sua Mãe e lhe diz: “Mulher, eis o teu filho”. Efectivamente, se Jesus tivesse outros “irmãos”, Ele não teria confiado Maria a São João, nem São João a teria “recebido em sua casa”, vistos que os “irmãos” de Jesus a teriam normalmente recolhido eles próprios. »
O nosso maior e sincero desejo, será que estas linhas possam ajudar aqueles que ainda possam ter dúvidas sobre esta parte difícil da Sagrada Escritura, e prestem assim a Maria o culto e a honra que na verdade merece.